Não sei se já lhes contei. Fui educado pelos padres franciscanos. Em 1957, aos onze anos, fiz o curso de admissão ao ginásio no Seminário Seráfico Frei Galvão, em Guaratinguetá, cidade vizinha de Aparecida. Na qualidade de seminarista e de menino cantor, soltei a voz, muitas vezes, no coro da Igreja que se tornaria o atual santuário de Nossa Senhora Aparecida. De 1958 a 1962 diz o curso ginasial o Ginásio e Seminário Santo Antonio, em Agudos.
Já naquele tempo, os freis professores alertavam os jovens seminaristas e talvez futuros padres sobre a crescente paganização dos festejos natalinos. O povo vinha se esquecendo do aspecto religioso do Natal e se preocupando mais com o lado comercial da data. O 25 de dezembro, dia do nascimento de Jesus Cristo, o salvador da humanidade, estava se tornando a época da salvação das vendas no comércio e do consumo.
Vai daí que transcorridos 60 anos, em plena época pré-natalina, nota-se que a ansiedade das crianças e dos adultos cresce com a aproximação do nascimento de Jesus e o alerta dos padres franciscanos, professores de minha infância, se concretiza. A vinda de Cristo anima a fé e o comércio. Parece que mais o comércio do que a fé. É o momento do aumento do consumo.
O bom velhinho de barba e de cabelos brancos, de roupa vermelha e que fala “ho-ho-ho” está em toda parte onde há gente interessada em queimar as economias, o décimo terceiro e o saque do FGTS em produtos típicos dos festejos natalinos. Nesta época, o observador atento percebe que o povo se esquece que Jesus veio para nos salvar e passa a acreditar que o décimo terceiro é o salvador das festas, da alegria, do congraçamento, da felicidade, da união familiar e do consumo.
De minha parte concluí por observação e por experiência que o período natalino se traduz e se reduz a uma sequência de produtos começados com pê.
O presépio é a lembrança mais sugestiva do evento e dispensa comentários. O Papai Noel, ao animar a festa e ouvir os pedidos da criançada, solta seu sonoro e típico “ho-ho-ho”. O panetone lota as prateleiras das casas comerciais e é item obrigatório em festa que se preze. O peru é o rei das ceias do Natal e sempre morre na véspera. Os presentes rolam de mão em mão e proporcionam alegria, satisfação e, às vezes, decepção. As prestações para financiar a festa e os presentes ficam momentaneamente esquecidas. A preocupação em agradar e impressionar, muitas vezes, faz esquecer do pê de pobreza!
Neste ano, os brasileiros terão de acrescentar mais um pê na lista dos pês natalinos: o pê do preço proibitivo da carne.
O preço da carne liquidou o 4º mandamento da Igreja: “jejuar e abster-se de carne conforme manda a Santa Madre Igreja”. Na prática os fiéis interpretaram mal a letra do preceito e imaginaram que além de jejuar não poderiam comer carne de vaca, de porco etc, etc. Afastar-se de carne foi a maneira elegante que os legisladores eclesiásticos inventaram para proibir as práticas sexuais. O resto foi efeito colateral.
Como se vê, interpretar e aplicar mal as leis não é exclusividade dos ministros do nosso STF. O povo também comete seus deslizes seja por ingenuidade, seja por ignorância ou seja por excesso de fé. Fica a certeza de que a lei do preço é severa e impõe respeito. Então, chega de carne vermelha! Vamos à carne branca enquanto for possível!
A ostentação dos dias de prodigalidade acaba por comprometer a saúde orçamentária e financeira da família pelo resto do ano. Nada de desespero e de estranhamento diante desta realidade. Mire-se no exemplo de Jesus que nasceu pobre; viveu pobre; fez milagre numa festa de casamento em Caná e se despediu dos apóstolos e do mundo com uma última ceia.
Caro leitor, que a fartura e a alegria de sua ceia de Natal se prolonguem indefinidamente ao longo de sua vida em companhia de seus entes queridos. Volte a ser um pouco criança e acredite que o Papai Noel ouvirá, encaminhará e concretizará seus sonhos. Só não caia nas promessas e na propaganda dos políticos oportunistas movidos a propina e a podridão. Para esses pilantras, os votos do povo são que o Papai Noel lhes traga prisão, penas severas e longo penar (perceberam a sequência de pês?). As pesquisas informam que a imensa maioria dos brasileiros deseja que o bom velhinho mande esse bando de bandidos para um lugar onde não bate sol.
Basta de pês e de pândega. Voltemos a pensar e a penar porque os prejuízos, com certeza, virão de carona no trenó do Papai Noel, na conta de energia elétrica pelo consumo das luzes do Natal, nos juros do cartão de crédito, nas propostas desastrosas do governo e nos gastos com gás para cozinhar a ceia! Ho-ho-ho…
Tô certo ou tô errado?
João de Barros Crepaldi, ex-vereador, por 3 mandatos, ex-secretário da educação, ex-professor, atualmente exerce a atividade menos penosa e menos perigosa: conserta motocicletas e já está atendendo normalmente após o recesso forçado.
Colunista:
João de Barros Crepaldi.
